O princípio da capacidade contributiva encontra-se veiculado pelo §1º do art. 145 da Constituição Federal, que prescreve:
Art. 145. [...]
§1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão
graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à
administração tributária, especialmente para conferir efetividade a
esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos
termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas
do contribuinte.
Encontra-se na doutrina variados conceitos para o referido princípio, o
mais completo deles é o das palavras de Regina Helena COSTA :
No plano jurídico-positivo a capacidade contributiva significa que um
sujeito é titular de direitos e obrigações com fundamento na legislação
tributaria vigente, que é quem vai definir aquela capacidade e seu
âmbito. No plano ético-econômico, por sua vez, relaciona-se com a
justiça econômica material. Aqui se designa por capacidade contributiva a
aptidão econômica do sujeito para suportar ou ser destinatário de
impostos, que depende de dois elementos: o volume de recursos que o
sujeito possui para satisfazer o gravame e a necessidade que tem tais
recursos.
Este princípio tem por base a determinação de um nível ideal de
tributação, permitindo ao Estado garantir suas necessidades econômicas,
sem impossibilitar a subsistência dos contribuintes. A doutrina, como o
faz como o faz José Marcos Domingos de OLIVEIRA divide esse princípio em
dois sentidos: capacidade contributiva absoluta e capacidade
contributiva relativa:
A capacidade contributiva é um conceito que se compreende em dois
sentidos, um objetivo ou absoluto e outro subjetivo ou relativo. No
primeiro caso, capacidade contributiva significa a existência de uma
riqueza apta a ser tributada (capacidade contributiva como pressuposto
da tributação), enquanto no segundo, a parcela dessa riqueza que será
objeto da tributação em face das condições individuais (capacidade
contributiva como critério de graduação e limite do tributo).
Assim, trata-se de capacidade contributiva absoluta ou objetiva quando o
legislador por meio de uma eleição escolhe eventos que demonstrem
aptidão para auxiliar nas despesas públicas. A partir da escolha desses
eventos irão ser apontados os sujeitos passivos em potencial.
Já a capacidade contributiva relativa ou subjetiva refere-se a um
sujeito individualmente considerado, sendo a aptidão que um cidadão tem
de contribuir na medida da sua possibilidade econômica.
A capacidade contributiva é verificada após haver a dedução dos gastos
da exploração e manutenção da atividade econômica e do mínimo vital.
Esse princípio é a expressão da justiça tributária. Neste sentido, vale
transcrever as palavras de Aliomar BALEEIRO :
Do ponto de vista subjetivo, a capacidade econômica somente se inicia
após a dedução das despesas necessárias para a manutenção de uma
existência digna para o contribuinte e sua família. Tais gastos pessoais
obrigatórios (com alimentação, vestuário, moradia, saúde, dependentes,
tendo em vista as relações familiares e pessoais do contribuinte, etc.)
devem ser cobertos com rendimentos em sentido econômico ? mesmo no caso
dos tributos incidentes sobre o patrimônio e heranças e doações ? que
não estão disponíveis para o pagamento de impostos. A capacidade
econômica subjetiva corresponde a um conceito de renda ou patrimônio
líquido pessoal, livremente disponível para consumo, e assim, também
para o pagamento de tributo. Desta forma, se realizam os princípios
constitucionalmente exigidos da pessoalidade do imposto, proibição do
confisco e igualdade, conforme dispõem os arts. 145, §1º, 150, II e IV,
da Constituição.
A Constituição Federal em seu artigo 145, §1º faz uso da expressão
"capacidade econômica" como sinônimo da capacidade contributiva, apesar
de muitos doutrinadores discordarem desta equiparação. Pois, para essa
corrente a capacidade econômica seria um dado anterior à capacidade
contributiva, esta somente existiria se aquela ultrapassasse um mínimo
vital. É o que defende Ives Gandra da Silva MARTINS afirmando que esses
dois conceitos não se confundem, a capacidade contributiva estaria
relacionada com a imposição específica ou global e que, nos termos da
lei, vincularia a dimensão econômica particular com o poder tributante e
a capacidade econômica existente independente dessa vinculação, seria
apenas uma exteriorização do potencial de riqueza do indivíduo.
Para este mesmo autor, a capacidade contributiva somente se inicia após
as deduções dos gastos destinados à satisfação das necessidades básicas
do contribuinte.
Para aqueles que defendem ter as expressões sentidos equivalentes, a
capacidade referida no texto constitucional envolve tanto as condições
pessoais do contribuinte quanto a riqueza que possui, e ainda a
capacidade econômica é sempre presumida, pois, sem tê-la não se pode
falar em tributação, é o que disserta Ricardo Lobo TORRES :
Capacidade contributiva é capacidade econômica do contribuinte, como,
aliás, refere à Constituição Federal de 1988, mantendo a tradição da
Constituição Federal de 1946, coincidindo também com a Constituição da
Espanha. É, pois, capacidade de pagar (ability to pay) como dizem os
povos de língua inglesa, significando que cada um deve contribuir na
proporção de suas rendas e haveres, independentemente de sua eventual
disponibilidade financeira.
No entendimento desse mesmo autor e outros seguidores como Fernando
Aurélio Zilveti, sem capacidade econômica não há que se falar em
tributação, uma vez que, uma pessoa pode ter capacidade econômica e não
ter condições de contribuir com o Fisco, como no caso, de um
contribuinte que aufere renda inferior ao mínimo tributável pelo Imposto
de Renda, participando ativamente da vida econômica teria, portanto,
capacidade econômica. Mas, no entanto, não teria capacidade contributiva
para fins da tributação sobre a sua renda.
A capacidade econômica está inteiramente contida na capacidade
contributiva, por isso, quanto maior for a capacidade econômica de uma
pessoa, maior será a capacidade contributiva, como disserta CARRAZZA :
Realmente, é justo e jurídico que quem, em termos econômicos, tem muito
pague, proporcionalmente, mais imposto do que quem tem pouco. Quem tem
maior riqueza deve, em termos proporcionais, pagar mais imposto do que
quem tem menor riqueza. Noutras palavras, deve contribuir mais para a
manutenção da coisa pública. As pessoas, pois, devem pagar impostos na
proporção dos seus haveres, ou seja, de seus índices de riqueza. [...]
É por isso que, em nosso sistema jurídico, todos os impostos, em
princípio, devem ser progressivos. Por quê? Porque é graças à
progressividade que eles conseguem atender ao princípio da capacidade
contributiva.
É importante salientar que as expressões "sempre que possível" e
"caráter pessoal" contidas no enunciado constitucional apresentam
sentidos interessantes.
A primeira quer significar que o legislador deve respeitar, ainda que
não se permita uma aferição direta, o princípio da capacidade
contributiva, como evidencia Hugo de Brito MACHADO :
(...) Por isto não temos dúvida em afirmar que o sentido da cláusula
sempre que possível contida no artigo 145 § 1º, da Constituição Federal,
é o de permitir a existência de impostos sem caráter pessoal, e não de
permitir imposto que não seja graduado segundo a capacidade econômica do
contribuinte. (grifo nosso)
Quando afirma que os impostos terão caráter pessoal sempre que possível,
o legislador refere-se à aptidão do imposto de poder se relacionar com a
pessoa do sujeito passivo da obrigação, considerando a sua condição
econômica e levando em conta os indícios que melhor valorizam a sua
condição. O caráter pessoal dos impostos tende a atingir melhor os
objetivos da justiça tributária.
Por fim, é importante ressaltar os efeitos desse princípio, em regra
pode-se dizer que o efeito é limitar o poder de tributar e em
contrapartida, assegurar os direitos subjetivos do cidadão-contribuinte.
Regina Helena COSTA , enfatiza, ao afirmar que o princípio da
capacidade contributiva é aquele orientador dos impostos (tributos
independentes de uma atuação estatal), e que as taxas e contribuições
(tributos vinculados a uma atuação do Poder Público), informam-se,
respectivamente, pelos princípios da retributividade ou da remuneração e
do benefício.
O ideal de justiça está inserido na conjectura humana, justificando
várias de suas ações, em nome dela foram travadas várias guerras e
conflitos. Diversas são as concepções em relação ao conceito e natureza
jurídica da justiça, mas sem dúvida a ideia de igualdade está presente
em todas elas, sendo esta o objetivo de quem pretende ser tratado com
justiça. Nessa esteira, José Marques de OLIVEIRA defende que "Justiça e
Igualdade, além de princípios jurídicos, são sentimentos próprios da
condição humana, vivenciados concretamente, e que permeiam
imperceptivelmente as constituições democráticas".
O primeiro conceito de Justiça foi introduzido por Aristóteles no livro V
da Ética e Nicômaco, relacionava a justiça com aquelas atitudes que
visam produzir e preservar a felicidade e todos os elementos que a
compõem, afirmando ser a virtude mais completa "porque quem a possui
pode exercer não só sobre si mesmo, mas também sobre seu próximo."
No campo tributário a ideia de se fazer uma tributação justa sempre foi
um desejo da humanidade. A justiça tributária é uma das formas da
justiça fiscal, que é um termo amplo, englobando a justiça tributária, a
financeira e a orçamentária. A justiça financeira abrange
transferências intergovernamentais e subvenções econômicas, já a justiça
orçamentária declara que as despesas e receitas públicas devem ser
justas. É a justiça fiscal responsável pela distribuição e
redistribuição de renda do Estado.
A capacidade contributiva é visto como o princípio fundamental para
exprimir a justiça tributária, onde cada um deve pagar o tributo em
conformidade com a sua riqueza. Nessa idéia a tributação deve respeitar o
mínimo existencial e um máximo suportável para que não desestimule as
pessoas a ganhar riquezas e assim produzam mais. Sendo inconstitucional
uma tributação que atinja o contribuinte naqueles recursos destinados as
suas necessidades básicas, imprescindíveis à garantia de sua
sobrevivência.
Sobre o assunto, esclarece José Marcos Domingues de OLIVEIRA :
Ser justo, em suma, é tratar a todos com Igualdade. Entendemos que no
Direito Tributário a Igualdade se realiza através do princípio da
capacidade contributiva, porque somente garantida a satisfação das
necessidades mínimas, comuns a todos, é que, ao depois, se poderá tratar
desigualmente os desiguais, discriminado-os licitamente com base nas
respectivas riquezas diversas.
A justiça tributária idealizada pelos tributaristas está presente em
muitos dispositivos constitucionais, como é o caso da seletividade do
IPTU encontrada no inciso II, §1 do artigo 156 da Constituição Federal,
objeto de estudo mais aprofundado no decorrer deste trabalho. Por este
dispositivo, a lei pode dar tratamento diferenciado em razão do uso e
localização do bem para fins de tributação do IPTU. Ora é bem verdade,
que o IPTU de um imóvel localizado em uma rua não calçada, sem
saneamento, será menor do que outro imóvel que se localize em uma rua
calçada e em perfeitas condições, essa é a própria seletividade e
justiça tributária.
Nenhum comentário:
Postar um comentário